Riva Bressanim Advogados

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STF e a nova visão da contingência trabalhista

Gabriel Bazalia Sales, especialista em contencioso e consultivo trabalhista, relações sindicais, auditoria trabalhista do Riva Bressanim Advogados

Artigo publicado no jornal Valor Econômico

Na última sessão do ano de 2020, que ocorreu no dia 18 de dezembro, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por maioria pela declaração de inconstitucionalidade da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária dos débitos trabalhistas e de depósitos recursais. O fundamento adotado pela Suprema Corte foi de que a aplicação da TR não reflete o poder aquisitivo da moeda (julgamento conjunto das Ações Declaratórias de Constitucionalidade – ADCs 58 e 59 e Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADIs 5867 e 6021).

O STF adotou e determinou a aplicação do IPCA-E na fase pré-judicial e da taxa SELIC a partir da citação, como fruto do entendimento de que esta reproduz a regra geral para as condenações cíveis, conforme dispõe o artigo 406 do Código Civil.

Foram adotados, ainda, efeitos moduladores desta decisão em duas situações.

A primeira remete aos processos que não comportarão rediscussão do índice: aqueles com pagamentos já realizados em tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais), considerados válidos qualquer que seja o índice que tenha sido adotado. Ao que nos parece, trata-se de execução definitiva ou provisória em que não se discuta o índice de correção monetária.

E os processos com decisões transitadas em julgado que adotaram expressamente a TR ou o IPCA-E, sobre as quais pairam os efeitos da coisa julgada e, em nome da segurança jurídica, não caberá nem mesmo ação rescisória.

A segunda situação é a aplicação da nova regra, aplicável aos processos sobrestados na fase de conhecimento,independentemente de proferida a sentença, cujo índice de atualização deverá ser a SELIC. Também enquadramos nessa hipótese os processos com trânsito em julgado, mas cujas decisões remetem ao Juízo da execução a decisão sobre qual índice de correção monetária a ser utilizado.

Dúvida ocorre nos processos cujo trânsito em julgado tenha ocorrido depois de 19.12.2020, nos quais foi adotado como índice de atualização dos débitos trabalhistas a TR. Nessa hipótese, estamos diante de cabimento de embargos à execução fundados na inexigibilidade do título judicial fundado em lei declarada inconstitucional pelo STF, nos termos do artigo 884, §5º da CLT. Vale dizer que consideramos perfeitamente cabível nesse cenário a exceção de pré-executividade, para evitar que a empresa tenha que desembolsar previamente a totalidade do valor.

Apesar da decisão plenária proferida pela instância máxima do Poder Judiciário Brasileiro, a problemática parece ainda não ter sido absolutamente solucionada, já quea decisão prevalecerá até que sobrevenha nova legislação, que por sua vez poderá determinar critérios e índices diversos, que ainda poderão ser questionados ou reavaliados pelo Poder Judiciário, a exemplo do que ocorreu com a própria TR.

É válido lembrar que até esta decisão diversos questionamentos e divergências apresentaram-se ao longo dos últimos cinco anos, já que a interpretação de inconstitucionalidade da TR se arrasta desde o ano de 2015, oportunidade em que o STF declarou sua inconstitucionalidade por afronta ao direito de propriedade, em decisão que afetou especificamente a correção dos débitos envolvendo a Fazenda Pública, mas que gerou interpretações por arrastamento na seara trabalhista.

Não obstante à possibilidade de alteração futura da legislação trabalhista acerca do índice de correção monetária aplicável, alguns questionamentos surgiram a respeito da aplicação do juros determinada pelo artigo 883 da CLT e artigo 39, § 1º, da Lei nº 8.177 de 1991, uma vez que a taxa SELIC compreende em seu índice os juros de mora, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp 1.025.298.

A nosso ver, a decisão não torna o artigo 883 da CLT “letra morta”, já que a norma em questão contém disposição específica sobre prosseguimento da execução em caso de inadimplemento do débito trabalhista pelo executado, determinando a penhora de bens com acréscimos de custas e juros de mora, sendo certo que este último seria atendido através da aplicação da SELIC, não havendo conflito, já que não há determinação específica sobre o percentual dos juros.

No que concerne ao disposto no parágrafo 1º do artigo 39 da Lei nº 8.177 de 1991, que determina a aplicação de juros de mora correspondentes a um por cento ao mês, aos débitos trabalhistas de qualquer natureza, é certo que a decisão do STF afasta sua incidência sem a declaração expressa de inconstitucionalidade, até porque sua aplicação somada à SELIC representaria juros sobre juros, o que é vedado pelo nosso ordenamento jurídico.

Assim, é fato que apesar de não haver discussão específica sobre os juros de mora, a questão da correção monetária foi enfrentada pelo STF com reflexos nos juros, já que em parte do voto constou a “aplicação da taxa Selic, em substituição à TR e aos juros legais, para calibrar, de forma adequada, razoável e proporcional, a consequência deste julgamento.”

Em suma, apesar de a decisão conferir alguma parcela de segurança jurídica para o momento, especificamente no que concerne à não aplicação da TR e do IPCA-E, não será possível colocar uma pá de cal no assunto, já que futuramente a questão deverá ser tratada por inovações legislativas.

Por fim, considerada uma decisão com consequências favoráveis aos empregadores, em razão da baixa da taxa SELIC (atualmente 2% ao ano), sendo certo que com a publicação do acórdão pelo STF será materializada a expectativa de adequação da contingência econômica, nos termos da modulação da decisão.

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